Evergrande: um novo Lehman Brothers?

Luiz Maia


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Por Sónia Fonseca Gomes e Luiz Maia

 

Na última semana, a segunda maior incorporadora da China – que emprega diretamente mais de 200 mil pessoas e gera outros 3,8 milhões de postos de trabalho indiretos – deu sinais de que a saúde financeira do grupo estava comprometida, diante do estresse provocado pelo vencimento de alguns compromissos.

É importante dizer que a Evergrand atua prioritariamente na área imobiliária, mas também apresenta ramificações na produção de veículos elétricos e na operação de parques temáticos, entre outras atividades. O porte considerável da empresa, que constrói simultaneamente 1.300 condomínios residênciais em 280 cidades chinesas e, para tanto, acumula uma dívida estimada em 305 bilhões de dólares, fez reacender os temores de uma crise semelhante à americana, com o colapso do banco de investimentos Lehman Brothers, em 2008.

Sabe-se que economia chinesa vinha em desaceleração no período pré-pandemia; seus indicadores pioraram com a Covid-19, freando ainda mais o seu ímpeto produtor e exportador. Mesmo sendo um dos primeiros países a registrarem sinais de recuperação, ainda em 2020, a China segue sentindo os reflexos da pandemia, inclusive devido à lenta e heterogênea recuperação dos demais países. Esses movimentos contrastam com a trajetória do país nas últimas quatro décadas, caracterizada por industrialização, urbanização e crescimento acelerados, forte expansão da classe média e, consequentemente, um mercado imobiliário com as melhores perspectivas possíveis. É justamente neste ponto que as semelhanças com a crise de 2008 se tornam mais evidentes: a valorização dos ativos e as oportunidades de especulação se viam bem articulados com um processo de endividamento crescente, com a abundância de crédito tida como infinita.

A questão que se coloca, neste momento, é como o governo comunista chinês se portará diante desse desafio. Haveria, em tese, dois cenários: o governo deixar a mão invisível do mercado resolver, por si só, o problema; ou os dirigentes chineses adotarem o receituário Too-big-to-fail, como ocorreu nos próprios Estados Unidos. A falência dessa grande incorporadora poderia, com certeza, comprometer de forma significativa as finanças de diversas outras instituições e, em última instância, o desempenho de toda a economia.

Por ironia do destino, tendo em vista as críticas de Pequim durante a Crise de 2008, os primeiros movimentos do governo chinês dão sinais claros em favor da segunda opção descrita acima, já que o Banco Central chinês injetou, de forma imediata, US$ 13,5 bilhões no sistema financeiro.

E “nóis” com isso? A realidade é que a China é um país extremamente integrado à cadeia de produção mundial. Grande parte do que é produzido no mundo, hoje, tem mão-de-obra e tecnologia chinesas. Trata-se do principal parceiro comercial do Brasil desde 2009 – na verdade, ela é o principal parceiro comercial de quase todos os países relevantes no comércio internacional. Dados do Ministério da Economia mostram que a corrente de comércio China-Brasil cresceu 19,5% entre os primeiros trimestres de 2021 e 2020. Assim, em que pese o sistema financeiro chinês não ser tão interligado como o americano aos bancos internacionais, os resgates sinalizados por dirigentes comunistas tendem a evitar maiores repercussões e, por enquanto, perdas de sono mundo afora. 


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